“O Ardiloso”

Querido diário…

Essa foi a primeira vez em toda a minha vida de passageira de Uber, que recebi R$ 10 em moedas. Sempre faço minhas corridas no cartão, mas desta vez fiz no dinheiro e quando lhe entreguei uma nota de R$ 50, para uma viagem de R$ 20, ele se desesperou. Me respondeu que só tinha R$ 20 de troco e ficamos em silêncio, um esperando o outro se pronunciar primeiro. Eu não poderia deixar R$ 10 para lá. Foi então que, ao ver que me calei, ao invés de dizer: “Tudo bem, pode ficar”, ele perguntou se tudo bem me dar R$ 10 em moedas. Contanto que não fosse em balinhas.

Daí o motorista do Uber viu o meu cliente parado na calçada há alguns metros de distância e não sei porque deduziu que ele me conhecesse. “Será que ele não tem?” Como assim? Eu não pediria para que ele pagasse a minha corrida sem ser algo previamente combinado. “Não ele não tem”, até porque, mesmo que tivesse, o dinheiro estaria no apartamento e não em seu bolso. “Mas será que ele não troca?” O motorista insistiu. “Acho que não…”, mas resolvi perguntar, vai que…

E a primeira frase que troquei pessoalmente com esse cliente, não foi um: “Oi, tudo bem?”, “Boa noite” ou “Prazer te conhecer”, mas sim: “Você troca R$ 50?”. E como eu já desconfiava, ele não tinha. O jeito foi receber o meu troco em moedas mesmo. O motorista procurou em cada buraco daquele carro. Foi uma situação tão estranha que quase reconsiderei e falei que não precisava. Quase. Óbvio que nem me preocupei em conferir, só queria subir para o apartamento logo. “Quer que eu coloque nessa sacola?” O motorista perguntou e agradeci pela prestatividade, seria muito bom que aquelas moedas não se perdessem na minha bolsa.

Enfim, tudo resolvido, saí do carro, cumprimentei o cliente, que gentilmente me esperava na calçada do seu prédio, e ele comentou com bom humor sobre o ocorrido. Pois, notou o desespero do motorista procurando as moedas, mesmo acompanhando tudo de fora.

Seu prédio é da mesma rede que o apartamento do Sugarman. Eu não sabia que existia uma rede de condomínios  residenciais similares como se fosse uma franquia de hotéis. O desse era um pouco menor, afinal a região que ele mora é zona norte e o outro zona sul, mas ainda assim achei bastante sofisticado, despojado e bonito.

Quando abriu a porta, o silêncio que estava até um segundo atrás, foi acalentado por “Somebody That I Used To Know” do Gotye. Achei um maravilhoso presságio começar aquele encontro com algo que eu conhecia e gostava muito. Amo essa música. Comentei com ele do som que estava tocando e percebi que ele ficou feliz em ter acertado, mesmo sem planejar.

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Me apresentou todo o apartamento, como se eu fosse uma pessoa ilustre (acho muito fofo quando atendo em domicílio e os clientes fazem questão de me mostrar tudo, como se eu fosse uma amiga e não uma estranha que está ali só para dar pra ele). Me deu uma rosa, que estava repousada num copo com água em cima da estante – que acabei esquecendo de levar quando fui embora – e então me ofereceu uma bebida.

Ele queria me preparar uma caipirinha de morango – inclusive fez a maior propaganda dos seus dons em fazer drinks – mas, estava tão fria aquela noite, que quis evitar tomar algo gelado. Ele então me persuadiu a tomar um vinho e não consegui resistir quando vi que ele tinha uma garrafa específica de um que aprendi a gostar muito, graças ao meu Cliente 407 (que ainda irei relatar). Vou inserir a foto da garrafa abaixo, mas saibam que a imagem não é deste encontro e sim de quando eu mesma fui atrás de comprá-la depois de conhecê-la em outro atendimento.

Vinho Moscatel CASA PERINI
Vinho Moscatel CASA PERINI

Daí fomos para o sofá com as nossas taças em mãos e começamos a conversar. Sabe, geralmente quando atendo em domicílio (que nem é tantas vezes assim), os clientes sempre costumam fechar 2h, pois a primeira hora é de conversa – eles querem ter a sensação de que realmente sou uma convidada e não que é uma situação de sexo pago – e a transa só desenrola no segundo tempo.

Já esse tinha fechado apenas 1h e via-se que gostava bastante de conversar. Eu já previa que o sexo só ia desenrolar perto do tempo acabar, consequentemente eu não teria coragem de interromper e ficaria naquele dilema interno se ele seria honesto de me pagar pelo tempo que excederíamos. Sem contar uma outra questão que será revelada na próxima estrofe.

Então procurei fazer com que as coisas andassem mais rápido, interrompendo suas falas com beijos. Às vezes funcionava, outras não, até que tive que apelar um pouco mais e sentei em seu colo de frente para ele. Em pouco tempo percebi que ele curtia uma preliminar mais caprichada e que não partiria para os finalmentes tão cedo, o que costumo adorar, mas que naquele momento me deixou preocupada. Eu tinha outro cliente uma hora depois e não poderia me dar ao luxo de passar do tempo com esse, ainda que ele me acertasse o tempo excedido.

Enquanto ele beijava meu pescoço, espiei o meu relógio de pulso e faltava quinze minutos para acabar o nosso tempo. Apenas quinze minutos e ele não era homem de rapidinhas. Fiquei tensa. Mesmo assim procurei me concentrar e focar neste encontro, ainda que este me prejudicasse a encontrar o de depois. “Vamos para a cama?” Tomei a iniciativa, numa tentativa inútil de acelerar o processo.

Ao chegarmos no quarto, ele quis me fazer uma massagem, que eu teria apreciado ainda mais se a minha mente não estivesse procurando soluções para aquele momento. Até que, certa altura (talvez quando ele estava com a boca na minha menina) seus carinhos começaram a captar ainda mais a minha atenção e me permiti relaxar. Quantas vezes os caras não marcavam comigo e desapareciam? Eu não poderia me recriminar por fazer igual pela primeira vez em quatro anos de profissão, não é mesmo? E outra, se passasse do tempo com esse, seria mais do que ético ele me acertar pelo tempo extra também. Isso compensaria o preju que eu teria não indo atender o outro. Ficaria elas por elas. Pensei. E relaxei.

Certa altura, depois de ambos fazer sexo oral no outro, tive a ideia de lhe retribuir a massagem também e fiz a tântrica, mas fui interrompida em pouco tempo, para que ele não gozasse. Foi então que tomei a iniciativa de transarmos, pois, as preliminares para mim já tinham sido suficientes. Ele concordou, pegou o seu preservativo, encapou e veio por cima, no papai e mamãe. Entrou com um pouco de dificuldade, já que a sua cabeça era mais grossa que o resto, mas então ficou gostoso e imediatamente estiquei o braço para pegar o meu brinquedinho dentro da minha necessaire que eu já tinha deixado perto.

Gozei lindamente após alguns minutos. Ele continuou mais um pouco e então foi também. Foi uma bela transa. Acreditam que do momento em que fomos para a cama, já havia se passado mais uma hora? Novamente não mencionei a questão do tempo pois, o vi mexendo em seu celular quando voltei do banheiro, me remetendo a ideia que ele tinha visto a hora e estava ciente que estávamos além do que tínhamos combinado.

Voltei para a cama, ele trouxe as nossas taças reabastecidas, que haviam sido largadas na sala, e voltamos a conversar. Conversamos por mais quarenta minutos, até que tive um clique em te falar do tempo, estava ficando estranho toda aquela tranquilidade dele em relação a duração do nosso encontro. “Já estamos indo para três horas… você viu?” Não. Ele não tinha visto ou pelo menos fingiu não ter visto. Perguntei se ele estava preparado (financeiramente falando, se é que vocês me entendem) e ele disse que não, demonstrando uma certa preocupação. Ops… tínhamos um impasse.

Eu considerava justo ele me acertar por 3h, já que, afinal, faltavam vinte minutos para isso. Mas, ele argumentou que estávamos apenas conversando, propondo um meio termo. Nesse momento ele disse algo que considerei bastante grosseiro até, que foi: “Entende o meu lado, estávamos conversando e se fosse para conversar, eu conversaria com um amigo, concorda?”

Como é?? “Mantém a compostura”, me ordenei mentalmente, enquanto me esforçava para não mudar a minha fisionomia ouvindo o que ele estava dizendo. Ele não parava de conversar desde o momento que cheguei e estava mesmo querendo tirar o seu da reta? Por um segundo me pareceu que ele estava insinuando que eu fiquei conversando de propósito para que o tempo passasse e eu ganhasse ‘sem estar trabalhando’. Quando, na verdade, o que eu mais queria era ter ido embora no término exato do tempo.

“Mas você que começou a conversar, você que conduziu, eu apenas te acompanhei”. Falei para ele. “O que seria um meio termo para você?”, perguntei tentando resolver aquilo logo. Duas horas. Ele considerava justo me acertar por apenas duas horas, transformando aqueles quarenta minutos de conversa pós-sexo num brinde. Francamente. Internamente não concordei, mas externamente sim, pois queria evitar mais mal estar e acabar logo com aquilo. “Vou me vestir então”, arrematei depois que ‘concordamos’ com aquele desfecho.

Deixei para tomar banho na minha casa, ainda que tivesse a sua saliva por todo o meu corpo, de quando ele me beijou inteira. Dei mais alguns goles na taça de vinho enquanto ele me transferia a diferença – pois é, ainda teve mais essa, tive que passar a minha conta, revelar os meus dados, para não ficar sem o restante do pagamento – e aproveitei para também autografar o meu livro, que lhe dei de presente. Ele teve a gentileza de me acompanhar até a calçada novamente, assim como quando cheguei.

Não vou dizer que gostei 100% do encontro, pois essa parte final me chateou um pouco. Por mais que eu estivesse curtindo seus carinhos, as sensações e etc, a parte financeira continuava sendo a mais importante. Eu não estava ali porque o conheci na night e fiquei com tesão em dar para ele. Estava ali à trabalho e dificilmente ele me conheceria fora daquela situação. Claro que, o meu trabalho é tornar esses encontros sexuais o mais orgânico possível, mas calma, nem tanto assim. Se eu faço a minha parte, então faça a sua. O cliente não paga pelo meu sexo e sim pelo meu tempo. O que ele quer fazer durante esse tempo, seja transar, conversar ou pintar uma parede juntos, é problema dele.

Então, deixo aqui um conselho a todos os homens que saem com acompanhantes: Tenham o bom senso quanto ao término do tempo. Muitas – e eu sou uma delas – não gostam de interromper o momento, não porque querem ganhar mais em cima da sua desatenção, mas sim, porque há muitos homens que detestam essa atitude da acompanhante, como se estivéssemos sendo mercenárias em ficar de olho no tempo. Será que, por acaso, todos estarão sempre dispostos a arcar com o tempo excedido então?